Você já se deparou com situações em que a fé foi sua última ferramenta contra alguma enfermidade? Você acredita realmente que há alguma relação entre fé e cura? Ou isso não existe? Veja bem, não estamos questionando ou afirmando a autenticidade do poder de Deus, ou existência de poder divino de religiões não cristãs. O que quero conversar com você hoje é se a fé pode influenciar de alguma forma a cura de um doente.
A fé tema ver com o aspecto psíquico do indivíduo. Envolve emoção, comoção, sentimentos aflorados, que nem sempre foram ligados à razão ou ciência. É algo tão forte que muitas vezes é característica marcante de algumas pessoas e até mesmo as impulsiona a grandes realizações. Há um grupo de pessoas que além do tratamento médico convencional, se abastecem de esperança por uma cura ou tratamento, através da fé. Existe outro grupo mais extremo, que abandona todo tratamento médico científico, confiando apenas em intervenções religiosas. Mas, e aí? A fé e a ciência estão juntas ou distantes?
Estudos realizados na Inglaterra tiveram o objetivo de analisar como a espiritualidade e a fé interferiram no tratamento de 155 mulheres com câncer de mama. Chegou-se à conclusão que usar recursos religiosos/espirituais no processo de enfrentamento durante os estágios iniciais de câncer de mama podem desempenhar um papel importante no processo de ajustamento nestes pacientes, visto que 5% sentem-se abandonadas e punidas por Deus, e outras não aceitam a doença inicialmente. Concluiu-se que embora a mortalidade não tenha diminuído de forma significativa, as intercorrências e complicações foram menores. Estes pacientes com acompanhamento espiritual tiveram menor número de infecções urinárias, recuperação mais rápida das complicações respiratórias e menor número de dias em internação. Pacientes com estímulos de sua fé através da assistência espiritual apresentaram melhor adesão ao tratamento, inclusive de forma mais precoce, aumentando assim as chances de cura.1,2
Em um segundoestudo realizado em Santa Catarina, com pacientes internados na UTI Cardiovascular, tentaram mostrar a importância da espiritualidade no cuidado com o paciente internato na UTI. Avaliou-se a interferência da fé, das orações, do acolhimento, da humanização, das emoções e dos sentimentos envolvidos durante o cuidado espiritual dos pacientes. A espiritualidade interfere no processo de recuperação dos pacientes, quando esta é vivida pela própria equipe de enfermagem e pela família. A espiritualidade é parte integrante do indivíduo, é ela que lhe possibilita encontrar significado e propósito para a vida, motivando-o e dando-lhe razão para viver.3
A ciênciamédica tem conseguido grandes avanços nos últimos anos. Descobertas de tratamentos com grande potencial de cura, avanços nos diagnósticos de doenças graves, bem como esclarecimento de enfermidades outrora misteriosas, aumento do acesso aos profissionais de saúde e consequentemente, precocidade nos diagnósticos e melhor prognósticos. Enfim, em
muitos aspectos a ciência está se desdobrando em benefício da saúde humana. A fé tem lugar nestes avanços?
Saber equilibrar as emoções frente a uma adversidade ou a uma doença talvez seja o segredo para manter a crença no que a ciência é capaz de fazer sem perder de vista a fé, afinal, “a fé é a certeza daquilo que esperamos e a prova das coisas que não vemos”!
1- Do religious/spiritual coping strategies affect illness adjustment in patients with cancer? A systematic review of
the literature.Social Science & MedicineVolume 63, Issue 1, July 2006, Pages 151–164
2- Espiritualidade dos familiares de pacientes internados em unidade de terapia intensiva.Acta Paul Enferm.2013; 26(1):71-8
3- A importância da espiritualidade no cuidado com o paciente internado na UTI Cardiovascular. SAÚDE REV.,
Piracicaba, v. 12, n. 30, p. 43-51, jan.-abr. 2012
Dr. Manoel Machado Pereira
Médico - Especialista em Saúde da Família (UFMG)
Médico da UBS Dr. José Pavie
Atende de segunda a quinta-feira no Hospital Itamarandiba (17:00 às 20:00 hs)

